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Descentralização da Saúde: CMC transforma-se num mero serviço administrativo da ARS-Centro


Cartoon da autoria do Movimento Humor

Intervenção do Somos Coimbra na Reunião de Câmara de 26 de outubro de 2020

Não entendemos como pode vir à Câmara para eventual aprovação um auto provisório de transferência de competências. Como é possível aprovar autos de transferência em versão provisória? Que modificações serão introduzidas posteriormente? Naturalmente, não será legal que depois de submetido a aprovação a Câmara introduza alterações nos termos dos autos.


Porque foi escolhido o ano de 2018 como referência para as transferências? Porque não 2019 ou 2020? Vamos transferir competências administrativas em 2021 com valores de 2018?

Importa referir que, em sede de auditoria, a Inspeção-Geral de Finanças concluiu que o orçamento da ARS-C, aprovado para 2017 (o mais recente que conseguimos consultar online), se encontrava subavaliado em cerca de € 52.8M, a que acresceria ainda a dívida transitada de 2016. Não tivemos acesso ao de 2018. Logicamente, a avaliação feita está abaixo da despesa real, pelo que a Câmara vai ser prejudicada!


Adicionalmente, os serviços chamam a atenção para os contratos a terminar, o que pode aumentar os custos, mas não é apontada nenhuma salvaguarda para esta situação nas transferências financeiras. A única coisa previsão dos autos é a correção pela inflação e as atualizações remuneratórias, o que deixa a Câmara demasiado desprotegida para custos inesperados e/ou necessários.


Pela análise do quadro I do anexo VII é fácil perceber que os valores a transferir são insuficientes:


Desde logo, em 2018 as transferências para desinfestação e arranjos exteriores foram no valor de zero euros, mas agora a Câmara assume essas responsabilidades, sem o devido financiamento, além de outros elevados riscos financeiros, ficando obrigada a, e cito:


E, por exemplo, quando for necessário contratar mais assistentes operacionais, agora da tutela da Câmara e que são atualmente em número claramente insuficiente, quem assume as respetivas despesas e decisão? Como não encontrei uma resposta explícita a esta questão, coloco-a aqui. Repare-se que a mobilização e substituição dos assistentes operacionais carece sempre de parecer prévio da ARS.


A CMC ficará responsável pela mera operacionalização das competências a descentralizar, mas vai ficar sob tutela de supervisão da ARS-C, pelo que apenas se verifica uma mera descentralização administrativa, em que a CMC vai funcionar como uma espécie de serviço administrativo da ARS, à qual tem de enviar relatórios permanentes das suas atividades.


Mais ainda, a ARS tem o poder de dar orientações ao município e mantém, relativamente a investimentos em eventuais novas unidades e a trabalhos de remodelação e beneficiação nas unidades existentes, um poder de emissão de parecer vinculativo.


É certo que tem toda a lógica que:


Mas como irá funcionar esta articulação? Pelos antecedentes de ambas as instituições, corremos o risco de que seja mais um fator de burocratização e atraso de decisão.


Quanto aos programas de prevenção da doença e prevenção da Saúde, a CMC fica sob tutela vinculativa da DGS em todos os programas prioritários e o Estado Central só pagará até um máximo de 50% do custos dos programas implementados.


Na verdade, a única coisa que é transferida para a CMC é o trabalho administrativo, sem autonomia de decisão, pois a ARS-C mantém todas as competências de orientação técnica. É impressionante o conjunto de obrigações da Câmara relativamente à ARS.


Quanto à Comissão de acompanhamento e monitorização, foi estranhamente definido no DL da descentralização que a monitorização é feita precisamente pelas mesmas pessoas e entidades que levam a cabo o processo de descentralização! É exatamente o mesmo que se passaria se colocássemos uma empresa que faz uma obra a fiscalizar-se a si própria; ninguém entenderia... Não faz sentido nenhum e o objetivo é que tudo fique em circuito fechado, em mais um claro sinal da nossa democracia doente. Ou políticos que “fazem” não gostam de ser escrutinados por um órgão independente. Muito triste para a democracia e muito mau para a idoneidade do processo.


Finalmente, a proposta do auto de transferência prevê que em caso de incumprimento pela Câmara as competências lhe possam ser retiradas pelo Estado, mas nada prevê em caso de incumprimento do Estado, por exemplo no caso de atraso das transferências financeiras. Porquê esta diferença de tratamento?


Pode chamar-se a isto de descentralização da Saúde? É óbvio que não.


Por tudo isto, iremos abster-nos nesta votação.


Somos Coimbra,

26 de outubro 2020

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