Opinião de José Manuel Silva publicada no espaço "Leitores" do "Diário As Beiras" , a 18 de junho
Senhor Diretor, a carta do leitor do colega José Gomes Ermida, por quem tenho um profundo respeito e admiração, publicada no “Diário As Beiras” de 15 do corrente, sob o título “Coimbra e o envelhecimento”, obriga-me a alguns comentários e a dar o exemplo concreto de Toulouse.
Admira-me o colega criticar uma proposta sem a conhecer, apenas com base numa notícia de jornal, que, pelas naturais limitações de espaço, não pode expor toda a sua abrangência.
Verifico que o Dr. Ermida parece preso a conceitos do passado, um pouco na linha do Prof. Costa Almeida, que não sabe distinguir um “lar de velhos” de um moderno hospital Geriátrico, ao jeito de quem não sabe distinguir uma creche de um hospital Pediátrico.
A utilização de meros chavões também não aprofunda o debate. Pode afirmar-se que um hospital Pediátrico representa a guetização das crianças? Claro que não! Então um conceito moderno de hospital Geriátrico também não representa a guetização dos idosos. O próprio Dr. Ermida reconhece a importância de ‘Unidades Geriátricas’. Existe alguma em Portugal? Não, lamentavelmente. Discutamos portanto o conceito e não as etiquetas.
Sim, é no seu domicílio, no seu meio, na sua família, que devemos apoiar o envelhecimento ativo e participativo dos idosos, ninguém o contesta. As coisas estão a ser bem feitas em Portugal? Não. Não há uma política desenhada a pensar os idosos no centro do sistema, muito menos com a sua participação ativa. Já foi pior, todos o sabemos, mas a proliferação de lares, muitos deles ilegais, é a imagem da (má) realidade do país, que temos de mudar.
Tive a ocasião de desenvolver um pouco mais a proposta de Hospital Geriátrico num artigo publicado num outro órgão da comunicação social e no facebook do movimento Somos Coimbra. Mesmo assim, muito mais há para dizer, naturalmente, daí que esta conversa epistolar também seja muito positiva. Dela pode sair uma ideia diferenciadora para Coimbra e para a Geriatria. Bem precisamos, numa das capitais de Distrito mais envelhecidas de Portugal.
A questão do futuro da Geriatria é extremamente importante e interessante (The future of Geriatrics. J Nutr Health Aging, 2020), mas, por questões de espaço, vou apenas referir o exemplo do “GÉRONTOPÔLE” de Toulouse.
O Gérontopôle de Toulouse foi o primeiro e único a ser certificado em França em 2007. Desde a sua criação que realiza pesquisas e ações preventivas no campo do envelhecimento. Em 2017, a OMS designou o Gérontopôle do Hospital Universitário de Toulouse como centro colaborador da OMS para a fragilidade, pesquisa clínica e treinamento em geriatria.
Esta Unidade/Hospital, com uma forte componente de formação, de investigação e de intervenção na comunidade, tem 200 camas de internamento e 17 hospitais de dia, com valências assistenciais que vão da medicina interna, à oncogeriatria, cardiogeriatria, urgência, cuidados paliativos, cuidados de longa duração, Alzheimer, memória, fragilidade, unidade cognitivo-comportamental, etc., etc..
Para além das outras valências médico-cirúrgicas que os Covões já têm e devem manter, que enorme salto qualitativo seria para a Geriatria e Gerontologia nacionais, a todos os níveis, a instalação de um Polo Geriátrico em Coimbra, para não lhe chamarmos Hospital nem Unidade, que o conceito, a ideia, a visão, o conteúdo funcional, a articulação, a integração de cuidados, a missão e a concretização são bem mais importantes que as etiquetas.
Todos sabemos que não estamos a cuidar bem dos nossos idosos, muito menos em hospitais de agudos de adultos, nada vocacionados e preparados para as múltiplas fragilidades, complexidades e necessidades do doente idoso.
Vamos pensar Coimbra e a Saúde do futuro, em modo construtivo, com uma perspectiva de reforço do SNS, para além dos rótulos e das críticas? Queremos que Coimbra se reafirme no panorama nacional e internacional.
José Manuel Silva, médico e vereador
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